Aula de viagem em Narvik

31 de julho de 2011

A ideia para chegar em Narvik era de carona: fiz cartaz com o meu destino, botei a minha mala no asfalto, bandeira do Brasil e a foto foi essa.

O cartaz serve para que as pessoas saibam que podem me ajudar.
A mala no chão mostra que eu sou um backpacker, e que levo a viagem a sério.
A bandeira do Brasil serve para mostrar que eu sou de longe e que não represento perigo, além de despertar a curiosidade que as pessoas tem pelo Brasil.

Mas, apesar de todas as manhas, a estrada era praticamente deserta, passava um carro a cada dois a três minutos, a maioria destes seguindo para o sul. Já tava percebendo que pegar carona seria um pouco complicado, tinha um ônibuus chegando, pensa rápido... ônibus.

No ônibus, a paisagem montanhosa chamava a atenção. Montanhas rochosas que subiam alto no céu azul e desciam íngremes no mar, isso acontecia também do outro lado, estava praticamente em um corredor de montanhas com o mar no meio, uma paisagem muito especial a qual os Noruegueses chamam de Fiorde (Fjord na grafia de lá).


Graças a internet no celular, comecei a falar com aquela coreana que conheci em Madrid, ela estava na Suíça sem saber para onde ir e perguntou se poderia vir me encontrar em Narvik, claro! Só que ela demoraria uns três dias até chegar, nenhum problema para mim.

Encontrei o Jim na estação de trem. O Jimmy é um dos primeiros participantes do CouchSurfing da Noruega e do Mundo, tem em sua bagagem a impressionante marca de 152 países visitados.

Sua grande meta de vida era visitar todos os países do globo, e para isso ele não costuma se aprofundar na cultura local, e suas viagens são sempre curtas com vários países na sequência. Isso é possível pois ele além de ter um bom emprego, vive na Noruega, um dos países mais caros do mundo, desta forma, para ele, todos os países que vista são destinos baratos. Ainda assim, peguei excelentes dicas de viagem e de roteiro.

Ele é do tipo quieto, mas mais tarde descobri que na verdade ele é cauteloso. Ficava tentando sondar minha opinião (muitas vezes com perguntas esquisitas) e quando via que eu era neutro mesmo para assuntos espinhosos, ele ficava mais tranquilo para soltar a sua própria opinião. Com isso ficamos conversando por muito tempo.

Exemplo de assunto delicado que tocamos foi com relação à invasão nazista que ocorreu em Narvik durante a Segunda Guerra Mundial. Os nazistas ocuparam ocuparam a região por quase 5 anos, sem grandes transtornos para a população local (exceto duas ou três famílias judias que desapareceram), para a população da época, os Ingleses e Franceses foram muito piores por bombardearem a região constantemente durante todo o período. Com isso, as pessoas de Narvik não têm uma opinião tão contrária aos Nazistas, basta ver o cemitério para soldados alemães que morreram na região, muito bem cuidado.

Ao final, acabei ficando com ele por três dias, infelizmente não pudemos fazer muita coisa. A ideia era ir ver um outro fiorde bastante famoso, mas o clima frio e chuvoso não ajudou muito.
Na última noite que fiquei com ele, fui apresentado à sua mãe, que também era uma viajante experiente. Além dela, havia também um casal, ela norueguesa, ele húngaro. Viviam em Budapeste e me convidaram a ficar com eles caso eu passasse por lá. Fechado.

No dia seguinte, fui buscar a Jae Yeon na estação rodoviária. O plano que eu havia imaginado era ficar um dia em Narvik onde o Jim disse que nos levaria em algum lugar, e seguir para Lofoten no dia seguinte.
Quando ela chegou, o plano dela era exatamente o mesmo, porém um detalhe, ela estava com a agenda apertada e queria ir naquele mesmo dia e o ônibus saia em 20 minutos, excelente... Saí correndo para ir buscar a minha mala, felizmente encontrei o Jim na saída e pude me despedir dele.

Nas montanhas de Abisko, o sol da meia-noite!

20 de julho de 2011


A jornada começa com a carona que peguei... O cara se chamava David, um simpático checo que estava de mudança para a Noruega. Ele é talvez um dos caras mais legais que já conheci na vida... Sempre com um sorriso no rosto, estava dirigindo sem parar por quase três dias, por todo o caminho entre a República Tcheca até a Noruega. Decidiu largar tudo para viver em uma fazenda próxima a Narvik.

Sabendo que eu me aventuraria nas montanhas, resolveu me dar um monte de comida que tinha estocada em sua van, que aliás era preparada para grandes viagens, segundo ele, ele foi até a Tailândia duas vezes com ela. Ele disse que se eu quisesse poderia comprá-la por algo entre € 1.000, juro que considerei essa possibilidade seriamente, mas dirigir garante uma dose extra de risco que não estou disposto a correr.
Fui com ele comprar uma barraca em Kiruna, nos despedimos em Abisko.

Chegando no camping, desempacotei a barraca e não era uma barraca, era um abrigo para o sol... Que raiva, e pior que já era tarde, não conseguiria um quarto no hotel, conclusão? Dormi no sofá da recepção, viva o CouchSurfing.
No dia seguinte, deixei a maior parte do peso da minha mochila no hotel e caminhei até a vila de Abisko e sem encontrar uma barraca, peguei uma carona até Kiruna onde achei uma excelente barraca, semelhante a que usei no festival. Agora estava tudo pronto para me aventurar na selva. Tentei conseguir uma carona até Abisko novamente, mas o local não era muito apropriado, caminhei até a estação e peguei um trem.
Saindo da estação fui direto ao Kungsleden (Trilha do Rei), haviam duas lindas montanhas logo a frente e a trilha seguia às margens de um rio de forte correnteza.


A trilha era bem fácil, seguia praticamente plana, e nos trechos de lama, havia tábuas de madeira para facilitar a caminhada.


Após 15 km e 4 horas de caminhada, cheguei em um acampamento na beira do rio, com bastante gente. Entre eles havia um casal de finlandeses que estava caminhando pelo últimos 5 dias em sua primeira aventura do gênero. Eles caminharam desde a Noruega até onde eu estava, uma caminhada e tanto. Muito interessantes e gentis, ficamos de papo até a hora de dormir. No dia seguinte, ficamos de papo no café da manhã até a hora de eu seguir viagem. Disseram-me que se eu passasse por Helsinke, já teria lugar para ficar. Ótimo, pena que não devo passar por lá.
Bem, eu havia planejado subir uma montanha para conseguir ver neve. Eu nunca tinha visto e tinha certeza que seria um encontro impressionante. A trilha desta vez não era tão simples, mata fechada, trilha estreita e de forte subida.


Após uma hora, não haviam mais árvores e subitamente eu tive o encontro tão esperado. Um monte de neve derretendo em um buraco na nascente de um rio, tirei várias fotos, enquanto ria que nem bobo.


O caminho agora seguia demarcado por sinais de pedra como esse:

Após mais alguns encontros, comecei a torcer para não encontrar mais neve. Acontece que a neve quando derrete deixa tudo o que está abaixo lamacento e cheio de mosquitos. Ahhhh os mosquitos, como me esquecer deles? Foram presença constante em todo o percurso da viagem. É quase como uma guerra, quanto mais os matamos, mais eles aparecem. Eu estava usando um repelente bastante eficaz, neste caso, não precisava me preocupar tanto com as picadas.
Não demorou para chegar ao topo da primeira montanha. Eu estava ensopado de suor, e após comer algumas sementes que eu havia levado, resolvi trocar de roupa e seguir caminhando seco.



Segui pelo topo da montanha até poder ver de longe uma ponte que estava apontada em meu mapa. Desci a montanha até encontrá-la, o que levou aproximadamente uns 45 minutos.


A ponte e atrás todo o percurso que fiz.

Errei o caminho, peguei um monte de lama para encontrá-lo novamente,e então resolvi seguir montanha acima. Eu já estava bem cansado, mas mesmo assim resolvi seguir, queria ver o sol da meia noite no topo da montanha que ficava ao lado do hotel, sabia que lá seria um dos melhores pontos para ver tal espetáculo.
A subida foi bem mais tranquila desta vez, não fiquei muito apegado a seguir a trilha, já me sentia seguro o suficiente para decidir meu próprio caminho seguindo o mapa, claro que o mapa não mostrava toda a lama que eu iria pegar e talvez seguindo a trilha eu pegasse menos lama, mas...


Havia um grupo de mosquitos me seguindo durante toda a subida, eu tentava dispersá-los mas nada, vinha o vento e... nada. Passei repelente e os ignorei. Chegando no topo havia algumas pessoas por lá, fiquei de certa forma feliz em ver gente, estava caminhando por quase 13 h sem ver ninguém, sentindo-me quase um selvagem, quando vi pessoas, me senti civilizado novamente.
Haviam me dito que após uma certa altura, os mosquitos não estariam mais lá... Estávamos a mais de 1100 metros e havia MUITOS mosquitos. Mas o que mais me incomodava mesmo era o frio e as roupas molhadas, resolvi trocar ali mesmo, o problema que não tinha mais calça, a solução seria deixar aquela para secar, mas naquele frio, impossível. Fiquei então enfiado no saco de dormir, peguei no sono e só acordei às 23h. Baita preguiça para tirar fotos, mas não dava para perder aquele momento.



Bateu meia noite, o sol brilhando no céu. Toda a minha viagem para o norte e para o alto da montanha tinha como desfecho aquele momento, o lago, as montanhas, tudo se juntava para fazer daquele momento mágico. Mas... olhando para o leste, uma cena inesperada mas ainda assim muito mais bela e rara.
A linda Lapporten em um raríssimo arco íris sob o sol da meia-noite.



Na falta de uma calça apropriada, peguei a calça do protetor de chuva, serviu perfeitamente.
A descida foi uma desgraça. Caminho lamacento na beira do riacho formado pela neve derretendo, íngreme como poucos que eu havia pego e, por ser descida, exige uma dos extra de atenção, qualquer vacilo e você desce o morro rolando. Havia uma pista de esqui e o caminho limpo não tinha árvores, pelo menos isso.

Após algumas horas chegamos no hotel que possuía um acampamento ao lado. Montei minha barraca lá, tomei um banho e fiquei de molho por dois dias.
O cansaço era tão grande que até considerei voltar pra casa. Só em casa a gente relaxa e descansa de verdade. Acampamento não é vida, é sobrevivência. Mas quando esse sentimento chega, o melhor a fazer é seguir em frente e sair procurando por novidades, e foi isso que fiz.

Segui para a Noruega, onde encontraria uma CouchSurfer lendário.

O caminho na Montanha:

Caronas e Surfe de Sofá


O CouchSurfing, para quem não conhece, é um site que coloca pessoas, interessadas em receber viajantes em suas casas, em contato com os viajantes, interessados em conviver com pessoas da cidade. É uma idéia genial e que conta no momento com quase 3 milhões de participantes em todo o mundo.
Para um viajante como eu, o site funciona da seguinte forma: Após decidir para onde vou e quando devo chegar por lá, procuro no site por pessoas que moram naquela cidade e que tenham disponibilidade para me receber. Todos possuem um perfil com informações básicas para sabermos quem são eles, além de referências de outras pessoas que estiveram em contato com eles. Desta forma, podemos saber se a pessoa que estamos em contato é confiável ou não.
Após encontrar um Host em potencial, envio uma solicitação e aguardo pela resposta.
Após ter ficado na casa do Pete em Falkenberg, compartilhando com ele e sua familia vários momentos do cotidiano, percebi que conviver com famílias possibilita uma experiência muito rica em termos de cultura local e pessoal. Decidi, portanto, focar minhas solicitações em famílias.
Escolhi a cidade de Umeå pois fica exatamente a meio caminho entre Estocolmo e Kiruna (meu destino final na Suécia). pelo CouchSurffing entrei em contato com a Eva, que com suas duas filhas mora em uma linda casa no suburbio da cidade.
A Eva me recebeu muito bem, me mostrou vários lugares interessantes da cidade e me levou para uma festa com alguns amigos dela. Foi MUITO divertido, todas as pessoas tinham histórias interessantíssimas para contar e se divertiam com algumas das minhas histórias. Preparei para eles algumas Caipirinhas com uma Pitu de R$ 60 a garrafa, ainda bem que eles adoraram, pois esse preço numa Pitu é sacanagem.
No outro dia fui com a Eva para uma casa de verão meio isolada da civilização. A casa fica na beira de um lindo lago onde podia-se ver um lindo  pôor do sol às 23h da noite. O nascer do sol não demorava mioto, próximo da 1h lá estava o sol. Dormir com essa claridade, é complicado...


Depois de voltarmos, a Eva me levou em um parque de esculturas próximo de sua casa, haviam obras magníficas, dignas de grandes museus, e estavam na praça ao lado de casa, bom não?

Havia também um desfile de carros antigos na cidade o qual fomo ver, a família o namorado de uma das filhas da Eva estaria lé, esperamos uma eternidade até eles aparecerem.

No dia seguite era dia de seguir viagem, a Eva tinha uma conhecida do CouchSurfing que poderia me receber na cidade de Overkalix, bastante distante no norte e segundo ela, seria possível conseguir uma carona até lá. Carona? Até que não seria uma má idéia para economizar uma grana, o problema é que li em vários sites que o povo da suécia não é muito de dar caronas. Mas... se ela disse que é sussa, vamos lá. Ela me deixou em um lugar excelente para caronas.
Esperei por não muito tempo até parar do outro lado da rodovia um carro e veio uma mulher muito simpática me oferecer carona, antes eles iriam passar em outro lugar, mas em seguida iriam seguir por quase todo o meu caminho. Dentro do carro duas mulheres e um cara, todos muito gentis, estavam indo canoar perto da Finlândia. Eles eram defensores dos direitos dos animais, vegans e feministas... Achei melhor nem falar que eu trabalhava com testes com animais na faculdade, que era carnivoro orgulhoso e que acho esse papo de igualdade entre sexos uma balela, vai que eles me deixam do meio da estrada.

Eles me deixaram em um posto na estrada que iria para Överkalix. Lá, após alguns minutos pedindo carona, consegui com um grupo de rapazes que ficaram quietos por quase toda a viagem. Chegando a Överkalix, recebi uma mensagem da Ann-Loise (a Lolo) dizendo que na verdade ela morava em LansJärv, a uns 50 km ao norte. Quando disse a eles, eles começaram a riir, pois também iriam para lá, nessa hora aproveitei o momento e puxei assunto, tava curioso para saber de onde ele eram: Romênia. A partir daí, os caras ficaram muito simpáticos, fizeram altas propagandas da Romênia e ficaram esperando até ter certeza de que a Lolo estava chegando.

Fiquei três dias com a Lolo e sua família, e foi uma experiêcia fantástica. Estava com ela também o Harrison, um australiano que fazia de tudo para ser o máximo, alem de falar muito e tão rápido que eu conseguia entender menos da metade do que ele falava (também porque eu não me esforcei tanto). Vi pelas fotos suas duas filhas, fiquei realmente impressionado. Quando conheci uma delas pessoalmente, meu queixo quase caiu, muito bonita, e o nome dela: Linda, irônico nào?
Entre as coisas que a Lolo nos levou para fazer:
Cachoeira (foram duas):
Em um local privilegiado, com uma natureza linda e água gelada demais para um banho.



Fazenda de Alces:
Lá estava um dos maiores alces que se tem notícia, segundo o dono, em alguns anos ele deverá entrar para o Guiness como o maior Alce do mundo. E turma, na boa, não sei de onde que saiu esse lance de que alces são símbolo de homossexualidade. O bicho é pelo menos duas vezes maior e mais assustador que qualquer touro que eu ja tenha visto.


Canoagem:
Contamos com as habilidades políticas da Anni, que nos arrumou duas canoas e saímos remando pelo RIo, a água estava muito gelada mas foi bem divertido. Meu parceiro de canoa foi o Harrisson, que não parava de falar...

Pausa para foto na placa do círculo polar ártico.


Advinha o que tem no Freezer:
A família da Anni, tinha a cabeça e a pele de um urso pardo no freezer. A caça lá e liberada e o grandão aí tava passeando no quintal deles quando virou caça.

Mina de Ferro:
UAU... Além de um museu que conta a a história da mineração local, pudemos dar um passeio na mina, sob mais de 1000 metros de terra. Precisamos fazer força para respirar o ar pesado de lá. O Harrison também foi...



Ah, a Lolo também cortou meu cabelo, que estava sem ser cortado desde que saí do Brasil.

Após a mina, eles me deixaram na estrada, onde eu iria pegar carona até Abisko, no pé da montanha.
A Linda, eu, Lolo e a Anni! O Harrison tirou a foto.

O roteiro deste trecho foi: